A morte de Odete Roitman, versão 2025: um resumo de “Vale Tudo”

Por Marcos Brasil

A morte de Odete Roitman foi, nos anos 80, um dos maiores fenômenos da teledramaturgia brasileira. Um mistério que parou o país, mobilizou debates acalorados e entrou para o imaginário popular. Hoje, ao revisitar a cena na versão adaptada por Manuela Dias para a nova edição de Vale Tudo, o que mais chama atenção não é o impacto dramático ou a força dos personagens — e sim a quantidade de erros de continuidade, escolhas superficiais e soluções apressadas que caracterizam a obra.

Não se trata de exagero. A audiência prova que, mesmo com todas as falhas, o público está lá: a novela registra índices expressivos na faixa das 21h, mantendo média entre 26 e 30 pontos de audiência nacional, com picos que superam os 32 pontos em capítulos-chave. Popular, sim. Bem escrita? Nem tanto.

A cena da morte de Odete é emblemática. No momento em que a personagem é alvejada, há uma troca perceptível de figurino: em alguns enquadramentos, ela está usando um cinto; em outros, o acessório desaparece. Essa troca súbita não é detalhe técnico irrelevante — é um sintoma. Em uma produção que deveria tratar esse clímax com precisão cirúrgica, a continuidade é atropelada em prol da velocidade. A morte, que deveria ser um ponto de virada calculado, se transforma em um amontoado de planos desconexos.

E isso não acontece apenas nesse momento. Seja no pastelão de Morango do Amor, na caricatura involuntária do Bebê Reborn, ou mesmo em temas mais densos — como a leucemia de Afonso e toda a trajetória trágica de Leonardo Roitman — o texto de Manuela Dias se repete: superficial, corrido e sem respiro. Não há espaço para as emoções decantarem, nem para os atores reagirem de forma orgânica. Tudo parece escrito no modo “resumo de capítulo”, como se a prioridade fosse encaixar o maior número possível de acontecimentos, não desenvolvê-los.

Em novelas clássicas, a morte de um personagem como Odete seria cercada de construção narrativa, preparação emocional e consequências dramáticas de longo alcance. Aqui, o momento chega e passa como um post de rede social: forte na imagem, fraco no conteúdo. A pressa em chocar substitui a arte de contar uma boa história.

O público, no entanto, permanece fiel — talvez mais pela nostalgia do título e pelo elenco carismático do que pela consistência da dramaturgia. O sucesso popular mostra que Vale Tudo, mesmo mal adaptada, ainda tem um peso simbólico enorme. Mas também deixa claro um fenômeno atual: novelas podem errar feio, desde que entreguem ruído e movimentem as redes. O problema é quando a cena mais importante da trama fica marcada não pela genialidade… mas por um cinto que aparece e desaparece.

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