A Mente Doentia do Comando: Saúde Mental e Narcisismo


​Setembro Amarelo. Um mês em que as redes sociais e os noticiários se enchem de mensagens sobre a importância de falar, de ouvir e de buscar ajuda. Mas o que realmente estamos falando? Enquanto a sociedade se mobiliza para quebrar tabus sobre a saúde mental, parece que algumas esferas, como a Polícia Militar, permanecem intocáveis, com uma cultura de silêncio que se choca com a própria essência do movimento.
​O paradoxo é gritante: enquanto se incentiva a conversa sobre a dor, o sofrimento e a busca por apoio, pouco ou nada se questiona sobre as condições de trabalho e as pressões psicológicas que afetam a saúde de quem está na linha de frente. E mais, não se discute a sanidade mental de quem comanda.
​O Narcisismo e o Poder Autoridade
​É preciso olhar friamente para a mente de quem comanda. A hierarquia militar, por natureza, impõe uma estrutura de poder. No entanto, o que acontece quando esse poder é exercido por mentes doentes, guiadas por um narcisismo que se alimenta da perseguição e do sofrimento alheio?
​Em muitos casos, a cobrança se torna excessiva e desumana, não com o objetivo de melhorar o desempenho da tropa, mas de reafirmar a autoridade e o controle de quem está no topo. Vemos chefes que se exaltam ao ver um subordinado sofrer, que se utilizam de práticas de assédio moral e que desrespeitam a vida pessoal e as dificuldades de seus profissionais. O resultado é uma tropa desmotivada, doente e oprimida, que não vê para onde correr.
​A reflexão que proponho aqui não é sobre a hierarquia, mas sobre a mentalidade que a conduz. Um líder saudável inspira, motiva e se preocupa com o bem-estar de seus subordinados. Um líder doente usa o poder para destruir. E nesse ciclo vicioso, quem sustenta o sistema é o próprio policial, que se vê sobrecarregado por uma pressão que vem tanto das ruas, no combate ao crime, quanto de seus próprios superiores.
​A Hora do Jogo Virar
​O policial militar é um trabalhador. Ele tem deveres, mas também tem direitos. Ele não tem FGTS, mas trabalha com a nobre missão de servir e proteger. No entanto, essa nobreza não pode ser confundida com servilismo. Não podemos continuar fingindo que esses homens e mulheres são imunes às pressões psicológicas e que seus líderes são infalíveis.
​Setembro Amarelo deveria, sim, começar de cima. É hora de questionar se os comandos passam por avaliações psicológicas que de fato questionam os limites de sua sanidade mental autoritária. É hora de ter a coragem de debater sobre o narcisismo disfarçado de liderança e de reconhecer que a saúde mental da tropa depende, em grande parte, da sanidade de seus líderes.
​É hora do jogo virar. A saúde mental não é apenas para quem está na base, mas para quem está no topo. E se não mudarmos a cultura de comando, continuaremos a ter um sistema que adoece e persegue, sem que a dor encontre um lugar seguro para ser ouvida.
Robson Fonseca
Fotojornalismo
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