Daniel Tavares
A simples menção da palavra “política” deixa muitos cristãos, sobretudo os mais conservadores, em estado de alerta. De forma natural surgem as perguntas: tal preocupação é legítima? Pode o cristão engajar-se em práticas políticas e ainda manter a sua posição de autêntico seguidor de Cristo? Que espécie de relação entre o cristão e a política seria eticamente aceitável e não colocaria o membro regular de uma denominação cristã em contraposição aos princípios bíblicos? Deve a igreja cristã envolver-se com essas preocupações?
Inicialmente precisamos reconhecer que é necessário existir governos a fim de se evitar o caos. Se havendo poderes nos deparamos com tantas mazelas, quanto mais grave não seria se cada um fizesse o que lhe parecesse melhor?
Em segundo lugar, a Bíblia nos afirma que todo governo que existe foi dado por Deus. Escrevendo aos romanos, o autor neotestamentário afirma que a autoridade civil é um instrumento de Deus para conduzir o cidadão para o bem e para fazer justiça aplicando penalidades a quem pratica o mal (ver Rm 13:1-7). O apóstolo Pedro, usando termos semelhantes, tem o seu pensamento alinhado ao de Paulo, como expresso em 1 Pedro 2:13-17. A linguagem deles dificilmente poderia ser confundida: a sociedade necessita de uma ordem política.
Se tal necessidade, porém, pode prover um vínculo mais estreito entre essa ordem e os cristãos, temos aí outro assunto que se constitui um aspecto mais delicado da questão.
A compreensão do termo chave “política” pode trazer luz a tal discussão. “Política”, em seu sentido amplo, denota originalmente a vida da cidade (polis) e as responsabilidades do cidadão (polites). Relaciona-se, portanto, com toda a nossa vida dentro da sociedade. Neste aspecto, política é a arte de se viver em comunidade. Por outro lado, em sentido restrito, política é a arte de governar, relacionando-se com a elaboração de medidas governamentais buscando perpetuá-las na lei.
Assim, quando o cristão resolve se encaminhar para o extremo da indiferença, omissão e conformismo, repudiando como pecaminoso um dos principais meios pelo qual o mundo poderia ser feito um lugar melhor para se viver, na verdade ele está se alinhando com o “status quo” vigente e colaborando para que permaneça.
A ética cristã pode e precisa ser aplicada às práticas políticas tanto quanto a outras formas de ação social. Em sua totalidade, a sociedade carece da influência cristã com suas inerentes preocupações voltadas para o bem dos seres humanos. Excluir o cenário político e suas vertentes do raio de ação do cristianismo parece, em realidade, atestar contra a própria fé cristã. Se por um lado a igreja deva manter-se em uma posição apolítica concernente a candidatos, políticos eleitos e partidos, por outro o cristão, como um indivíduo, e a igreja, como um corpo organizado, não podem se omitir nessa tão importante questão abrangendo as ações sociais. Os princípios cristãos são grandiosos demais para ficarem confinados às quatro paredes de uma igreja.
Agir desta forma certamente é pecado de omissão.
Daniel Tavares é Advogado e Ministro do Evangelho
